segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Becas

Becas era uma cadela de 10 anos. Fomos buscá-la ao canil, há oito anos atrás.

Era média, tinha parte da cara laranja como um deserto reflectido ao sol, e o resto do corpo era branco, branco esse que parecia neve fofa da Serra da Estrela.

Estávamos em princípio de Julho, quando notámos que ela estava “murcha”. Fomos ao veterinário, e a médica disse que ela tinha uma “hérnia”, um problema de coluna e por isso dobrava a pata. Marcou uma consulta com um médico, em Lisboa.

Na noite da chegada, já na casa de Lisboa, a Becas começou a tremer e da boca dela começou a sair espuma branca. Como aquela do mar, mas estava presa na sua boca, como o mar preso em angústia. Chegou a molhar o tapete, num círculo imperfeito.

Três noites depois, a noite antes da consulta, começou a chiar; estava com dificuldades respiratórias. Isto tudo às cinco da manhã. Os meus pais tiveram que levá-la a um veterinário, para a abater. Eu e a minha irmã preferimos ficar em casa; não queríamos ver.

Quando os meus pais chegaram, não traziam nada.

Havia outros pormenores, deveras sem importância: o sol a bater na cara dos meus pais, leve. A minha garganta a doer; um nó.

-Sim, ela morreu – disse a minha mãe.

                                                                                         Pedro Vidigal

Sem comentários:

Enviar um comentário